Lúcio Delfino
advogado e consultor jurídico em Uberaba (MG), doutor em Direito Processual Civil pela PUC/SP, professor dos cursos de graduação e pós-graduação da UNIUBE/MG, membro do Conselho Fiscal (suplente) do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (BRASILCON), membro do Instituto dos Advogados de Minas Gerais, membro da Academia Brasileira de Direito Processual Civil, diretor da Revista Brasileira de Direito Processual.
1. Arnaldo Rizzardo, em obra de profundidade sobre o instituto da responsabilidade civil, apresenta, num de seus capítulos, sua análise acerca do tema objeto desse ensaio [01].
Para o jurista, as ações que têm surgido no Brasil, buscando indenizações pelos malefícios resultantes do tabagismo, são oriundas do plágio de prática vigorante em outros países. Esclarece, ainda, que se deve ter em mente que, nem tudo o que se adota ou se aceita em outros sistemas jurídicos é adequado ao sistema nacional ou impõe-se que aqui se aceite, a fim de que não se cometam disparates absurdos, como os ocorridos, em diversas ocasiões, nos Estados Unidos da América do Norte. Para o mestre, o tema "responsabilidade civil da indústria do fumo", diz mais com lógica e bom senso, do que com os tratados jurídicos [02]. Sua posição basicamente escora-se numa construção pautada na licitude da atividade, liberdade de opção, adequação de informações prestadas pelas fabricantes, inexistência de defeitos e risco inerente afeto ao cigarro.
É de se dizer, porém, que a lógica e o bom senso apenas ancoram a tese da irresponsabilidade civil da indústria do fumo, acaso se adote uma interpretação rasa do sistema jurídico nacional, descompromissada com os princípios regentes do Código de Defesa do Consumidor, com a teoria do abuso do direito, e alheia a alguns direitos constitucionais fundamentais, data maxima venia.
Ressalte-se que o ordenamento jurídico pátrio mostra-se perfeitamente adequado a autorizar indenizações proferidas contra a indústria do tabaco, em razão de danos que o consumo de cigarros acarreta aos seus consumidores. Não se há, para tanto, que se trabalhar o pensamento em construções falsas, adaptando institutos jurídicos não afetos à responsabilidade civil, consoante intenta fazer crer outro autor, em artigo jurídico sobre o assunto [03].
A postura adotada pela indústria do tabaco, no decorrer de décadas e décadas, não só no Brasil, como na maioria dos países em que os seus produtos encontram-se disponíveis no mercado, denota uma prática irregular do direito de produção e comercialização de cigarros, na medida em que foi ela responsável pela criação de uma atmosfera artificial de dúvidas e ceticismo acerca da natureza do cigarro e dos riscos à saúde advindos de seu consumo. Essa deslealdade na relação de consumo, capitaneada não só pela omissão intencional de informações necessárias ao esclarecimento da sociedade acerca dos possíveis malefícios gerados pela prática do tabagismo e da própria natureza do cigarro, mas também pela divulgação de publicidade insidiosa e ilegítima, [04] resulta numa circunstância de evidente abuso do direito, suficientemente capaz de encampar a tese aqui defendia [05].
De mais a mais, um exame do tema, com os olhos voltados exclusivamente no Código de Defesa do Consumidor, é perfeitamente idôneo no sentido de conferir ao julgador elementos abalizadores suficientes para espancar a tese da irresponsabilidade civil da indústria do fumo, bem assim apto a fundamentar sua obrigação de indenizar os malefícios acarretados pelo uso do produto nocivo que fabrica.
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Para ler o artigo por inteiro, siga para o Jus Navigandi.